Estudar até passar. Este é o lema dos concurseiro que disputam milhares de vagas na área pública.
Redação Publicado em 16/10/2008, às 17h39
“Estudar até passar”. Este é o lema de todo concurseiro que disputa as milhares de vagas que são oferecidas pela área pública anualmente em todo o país.
Porém, para alguns deles, a tarefa de estudar para concursos não termina com a aprovação. Pelo contrário. Depois de aprovados, eles sentem-se estimulados a prestar outros concursos e continuarem disputando outros cargos. Mas isso acontece por necessidade ou por vício?
Para Paulo de Freitas, 46 anos, oficial de Promotoria no Ministério Público do Estado de São Paulo, o hábito de prestar concursos é uma necessidade, visto que o candidato sempre almeja a cargos melhores. Ele já prestou cerca de 30 concursos, foi aprovado em três e, atualmente, trabalha na sede do MP, em Vinhedo.
Graduado em Jornalismo, Paulo conseguiu conquistar um emprego estável com ótima remuneração, mas não pensa em parar por aí. Agora, pretende estudar para o cargo de Analista Judiciário da Justiça Federal, que oferece vencimento em torno de R$ 7.000.
“Acredito que o que leva a pessoa a continuar prestando concursos é não ter alcançado o seu objetivo final, como é o meu caso”, salienta.
Quando vira vício
A busca por melhores salários é uma constante na vida profissional de qualquer pessoa. Porém, em alguns casos, não é só isto que movimenta o empenho na busca de outros cargos públicos.
Formado em Administração de Empresas, Alexandre Mantovani, 37 anos, concurseiro assumido, dono de um blog na Internet através do qual visa compartilhar suas experiências com outros concurseiros (www.blogdoconcurseiroale.blogspot.com), acredita que prestar concursos por necessidade sempre fala mais alto. No entanto, ele afirma que os candidatos podem ficar “viciados” por causa do bom desempenho nas provas. “Conseguir uma boa colocação, ainda que insuficiente para estar entre os primeiros, gera no candidato uma sensação prazerosa, de vencer desafios e de achar que pode melhorar”, diz
O concurseiro chegou a abandonar seu emprego na iniciativa privada só para se dedicar aos estudos. Ele obteve recentemente a primeira colocação no concurso da Prefeitura de Valinhos (SP) para o cargo de Fiscal de Obras Públicas. Enquanto não assume a função, continua estudando para outras provas. Alexandre almeja ocupar os cargos de Analista Judiciário do Tribunal Regional do Trabalho ou de Agente da Polícia Federal.
Mantovani diz que para ele o vício em concurso está no fato de ter descoberto um mundo de aprendizado e de muitas conquistas. “Ao perceberem que obtiveram um resultado melhor que o esperado, os candidatos ganham uma motivação-extra para continuar persistindo e, então, resolvem não parar mais”, diz.
Essa idéia é partilhada pela psicóloga e professora universitária, Luiza Ricotta. “Participar de processos seletivos é um constante desafio. Os candidatos se gratificam pela conquista de uma posição pelos seus méritos, desafiando seus limites em busca de um melhor desempenho, na obtenção de condições favoráveis à sua aprovação – o coroamento de todo o seu empenho” destaca.
Para especialistas, concurso não é vício
Apesar de compartilhar da idéia de que o desafio atrai muitos concurseiros, Luiza acredita que prestar concursos é uma escolha e por isso está mais próximo de uma necessidade do que de um vício. “O vício envolve um movimento mecânico, compulsivo e ansioso. A escolha pela carreira pública certamente promoverá a formação de um perfil característico de profissionais que optam por um caminho menos cômodo e usual”, analisa.
A psicóloga Fernanda Pellegrini complementa essa idéia ao afirmar que são raros os casos de candidatos viciados em concursos. “Não podemos falar em vício ou dependência quando não há perda de controle”, explica.
Para o professor Carlos Alberto De Lucca, que prepara candidatos para concurso desde 1979, as pessoas que prestam concursos só por que sentem prazer em realizar as provas são exceções. “Os candidatos têm objetivos pré-estabelecidos: conseguir estabilidade, uma boa remuneração, uma atividade profissional que lhe agrade, mudar de cidade ou mais de um destes motivos”, esclarece.
“De um modo geral, quando uma pessoa presta o primeiro concurso público, mesmo não conseguindo uma boa pontuação, fica com a sensação de que se tivesse estudado um pouco mais, passaria”, finaliza.
Desafio e motivação
A adrenalina dos concursos tem atraído inclusive jovens, como Iago Kenj, 21 anos. Ele começou a prestar concursos assim que se formou no Ensino Médio, em 2004. Até o momento, calcula que deve ter passado por aproximadamente 15 processos seletivos. A maioria de seus empregos foram conquistados por meio de concursos. Ele já foi aprovado em processos da Câmara Municipal, Nossa Caixa, Zoológico e em três da Universidade de São Paulo (USP).
Atualmente, Iago trabalha como Técnico Acadêmico na Faculdade de História da USP. Ele afirma que gosta de prestar concursos por serem objetivos e dependerem apenas do candidato. “Comecei a prestar concursos porque não possuía experiência profissional, o que me excluía das melhores vagas da iniciativa privada”, conta. Para ele, os concursos são uma necessidade até a conquista de um cargo com boa remuneração, mas podem se tornar um vício a partir do momento que a pessoa presta concurso mesmo visando salário próximo ao que possui.
Andréa Carolina Ferreira/SP