Projeto de lei na Alesp define critérios para realização de concursos SP, incluindo proibição de novos certames ainda com seleção em validade
Fernando Cezar Alves Publicado em 09/02/2024, às 09h24
O projeto de lei 524/2022, que regulamenta novos critérios para a realização de concursos SP, já está pronto para ser votado no plenário da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp). O texto foi aprovado, na úlima terça-feira, 6 de fevereiro, pela Comissão de Finanças, Orçamento e Planejamento, última comissão temática antes da votação final.
A proposta abrange diversos critérios pontuais para a realização de concursos no estado, incluindo:
Desde o início do mandato, estes deputados recebem os pleitos de nomeações dos aprovados em concursos públicos no Estado de São Paulo, independentemente do número previsto nos editais.
Seja pela expectativa dos aprovados, seja por uma questão de economia de gastos públicos, os signatários sempre defenderam a pauta em discursos no Plenário e reuniões técnicas, além de terem elaborado ofícios e indicações às autoridades competentes, além de emendas aos projetos orçamentários.
Em 2020, ademais, estes parlamentares defenderam emenda que suspendia o prazo de validade dos concursos públicos durante a discussão do PL nº 350/2020, que foi acatada e sancionada na forma da Lei nº 17.268, de 17 de julho de 2020, que dispõe sobre medidas emergenciais de combate à pandemia.
Para que os aprovados sejam nomeados, quando há cargos vagos, é necessário derrubar a chamada “cláusula de barreira”, ou de “afunilamento”, constantes em editais de concursos públicos, que estabelecem limitações com o intuito de selecionar apenas os candidatos melhores classificados para prosseguir no certame, ainda que muitos tenham obtido a nota mínima estabelecida no edital.
Antes de iniciar a explicação da propositura, é importante destacar que a cláusula de barreira pode ser utilizada não apenas para limitar a quantidade de pessoas que são consideradas aprovadas após a finalização de todas as fases, mas também para limitar a quantidade de pessoas que seguem para as próximas etapas.
No Estado de São Paulo, essa sistemática foi estabelecida no artigo 30 do Decreto nº 60.449, de 15 de maio de 2014, que regulamenta os procedimentos relativos à realização de concursos públicos, no âmbito da Administração direta e autárquica do Estado, alterado pelo Decreto nº 63.651, de 16 de agosto de 2018. Confira-se:
Artigo 30 - Os critérios de aprovação em concurso público serão por:
I - desempenho mínimo nas provas; ou
II - desempenho mínimo nas provas e número máximo de aprovados, por fase ou no resultado final do certame.
§ 1º - No caso de estabelecimento de número máximo de aprovados para fases intermediárias do concurso público, deve-se prever o percentual legal de reserva de vagas para candidatos com deficiência.
§ 2º - Nenhum dos candidatos empatados na última classificação de aprovados será considerado reprovado.
Artigo 31 - Os resultados das etapas do concurso público deverão ser publicados no Diário Oficial do Estado e no Portal de Concursos Públicos do Estado de que trata o artigo 44 deste decreto.
Artigo 32 - O candidato aprovado no concurso público, dentro do limite de vagas disponibilizado nas instruções especiais do edital de abertura do concurso público, terá garantida sua nomeação ou admissão dentro do prazo de validade do referido concurso.
Parágrafo único - Aqueles aprovados além do número de vagas disponibilizadas no edital de abertura do concurso público, durante o prazo de validade do respectivo concurso, passarão a compor a lista de candidatos remanescentes.
Já a especificação do número de cargos a serem providos foi definida na Lei nº 15.295, de 08 de janeiro de 2014. Transcreva-se:
Artigo 1º - O edital de cada concurso público de provas ou de provas e títulos no âmbito da administração direta e indireta do Estado de São Paulo não poderá deixar de prever a especificação do número de cargos a serem providos.
Parágrafo único - Vetado.
Artigo 2º - Vetado.
Artigo 3º - Vetado.
Artigo 4º - Vetado.
Artigo 5º - Os candidatos aprovados deverão ser nomeados no prazo de validade do concurso.
Artigo 6º - Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Este PL, portanto, apesar de revogar a supramencionada Lei, reaproveita seus dispositivos, mas estabelece, nos parágrafos primeiro e segundo, que os candidatos aprovados, que não tenham sido classificados dentro do quantitativo de vagas disponibilizadas no concurso, não podem ser considerados eliminados, com a criação de cadastro de remanescentes.
Por sua vez, o parágrafo terceiro determina que, independentemente de prazo de validade ou prorrogação, fica proibida a abertura de novo concurso público para o provimento do mesmo cargo, quando há aprovados, ainda não convocados, inclusive no cadastro de remanescentes.
Já o artigo 2º prevê que a passagem de fase ou etapa em um mesmo certame dependerá exclusivamente do alcance de nota previamente fixada no edital, sem qualquer outra cláusula de barreira. Em outras palavras, o critério de aprovação no concurso público, ou a passagem de fase, dependerá exclusivamente do desempenho mínimo nas provas.
Nesse sentido, o supramencionado decreto prevê, em seu artigo 10, que o prazo de validade do concurso público será de no mínimo 06 (seis) meses e de no máximo 2 (dois) anos, contados a partir da data de homologação do certame, e poderá ser prorrogado uma única vez por igual período.
Com a aprovação do projeto, as entidades públicas serão obrigadas a planejar melhor a abertura de novos concursos, pois somente poderão abrir novo concurso após chamar, obrigatoriamente, todos os aprovados dentro do quantitativo de vagas disponibilizadas e todos os aprovados no cadastro de remanescentes.
Há inúmeros benefícios a justificar o aproveitamento daqueles que foram aprovados para a nomeação ou para o prosseguimento nas etapas.
Por um lado, limitar para que apenas os aprovados dentro de um determinado número de vagas sejam nomeados, ou prossigam para a próxima fase, é uma injustiça para com os candidatos que dedicaram tempo e energia e que conseguiram a nota esperada, mas que não são convocados, ou que não prosseguem no concurso, pelo simples fato de o edital estabelecer uma cláusula de barreira.
Por outro, isso acarretará economia de verbas públicas, dado que a realização de novos concursos exige dispêndios por parte da Administração. Não se pode permitir que gastos desnecessários se consolidem, sendo importante aproveitar todos os classificados, que inclusive pagam taxas de inscrição. Confira-se o custo de alguns certames recentes contratados pelo Poder Público:
•Ingresso nas carreiras da Polícia Civil do Estado de São Paulo, sendo 250 cargos de Delegado de Polícia, 900 cargos de Investigador de Polícia, 1600 cargos de Escrivão de Polícia e 189 cargos de Médico Legista, no valor de R$ 7.015.000,00 (sete milhões e quinze mil reais). (Disponível aqui)
•Ingresso na Polícia Militar, no cargo de Aluno Oficial PM, no valor estimado de R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais). (Disponível aqui)
•Ingresso na Polícia Militar, no cargo de Soldado PM de 2ª Classe, no valor de R$ 3.293.100,00 (três milhões, duzentos e noventa e três mil e cem reais) e R$ 3.547.800,00 (três milhões, quinhentos e quarenta e sete mil e oitocentos reais) (Disponível aqui e neste link)
•Ingresso na Secretaria de Educação, para os cargos de Supervisor de Ensino e Oficial Administrativo, no valor estimado de R$ 1.705.000,00 (hum milhão, setecentos e cinco mil reais). (Disponível aqui)
Consigna-se que esta Parlamentar tem ciência de que o Supremo Tribunal Federal aplicou repercussão geral no Recurso Extraordinário nº 635.739/AL, que ficou decidido com a seguinte tese:
É constitucional a regra inserida no edital de concurso público, denominada cláusula de barreira, com o intuito de selecionar apenas os candidatos mais bem classificados para prosseguir no certame.” (Tema 376 - Cláusulas de barreira ou afunilamento em concurso público)
Nada obstante, muito embora a cláusula de barreira seja, de fato, constitucional, não há óbices para que as Casas Legislativas legislem com o objetivo de derrubar esse instrumento.
Nesse sentido, destacam-se a existência das Leis Estaduais nº 9.650 e 9.651, de 13 de abril de 2022, do Rio de Janeiro, nº 11.791, de 30 de maio de 2022, do Mato Grosso, e da Lei Distrital nº 6.488, de 14 de janeiro de 2020, todos de iniciativa parlamentar. Proposituras semelhantes tramitam nas assembleias de Minas Gerais (PL 3.537/2022), Amazonas (PL 77/2022) e Paraná (PL 54/2022).
A Lei do Mato Grosso, inicialmente, foi vetada integralmente pelo Governador, sob o fundamento de que a cláusula de barreira seria instrumento de gestão pública para classificação dos mais bem selecionados nos concursos. O veto, entretanto, foi derrubado pela assembleia.
Já a Lei Distrital foi questionada no Supremo Tribunal Federal, no Recurso Extraordinário nº 1.330.817/DF, mas a Corte declarou a constitucionalidade da lei. A decisão também reafirma que matéria de concurso público não é de competência privativa do Chefe do Executivo, sendo possível a propositura por parlamentar. Confira-se:
[...] Não há falar em reserva da iniciativa parlamentar para além das hipóteses taxativamente previstas no texto da Constituição da República Federativa ou Estaduais, por força do princípio da simetria. Os diplomas legais que não criam ou alteram a estrutura ou a atribuição de órgãos da Administração Pública, nem tratam do regime jurídico de servidores públicos, não usurpam a iniciativa do Chefe do Poder Executivo. [...]
Passo à análise do aspecto material da norma impugnada. Da simples leitura do texto normativo, é possível depreender que a legislação distrital nada mais fez do que garantir que os candidatos aprovados no certame, mas classificados fora do número inicial de vagas disponibilizadas, possam ser convocados a assumir cargos públicos, a depender da necessidade do serviço e respeitada a ordem de classificatória.
Destaco trecho do parecer oferecido pela Procuradoria-Geral da República, nesse mesmo sentido (eDOC 10, p. 5-6):
“Igualmente não vislumbro vício material, porque a lei impugnada tão somente impede a eliminação automática dos candidatos não classificados - “Os candidatos que não tenham sido classificados entre o quantitativo de vagas disponibilizadas no certame não podem ser considerados eliminados” - não criando, revogando ou alterando qualquer direito dos servidores públicos, nem tampouco violando os princípios da isonomia e da exigência do concurso público para o provimento de cargos e empregos públicos, previstos, respectivamente, nos artigos 5º, caput e 37, II da Constituição Federal.”
Assim, não há que falar em criação novos critérios de aprovação e classificação, mas apenas em formação de cadastro de reserva, conforme interesse da Administração Pública.
A norma distrital não incorre em qualquer violação à isonomia ou à razoabilidade, já que respeitada a ordem classificatória, e nem cria direito subjetivo à nomeação dos candidatos classificados fora do número de vagas, conforme a tese fixada no RE 837311, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 18.4.2016, sob a sistemática da repercussão geral, Tema 784. [...]
Veja-se, portanto, que é perfeitamente possível que o Estado de São Paulo aprove o presente projeto, sendo certo que o texto aqui proposto é similar às leis do Rio de Janeiro, Mato Grosso e do Distrito Federal.
Consigna-se, ademais, que a supramencionada decisão esclarece que a Lei Distrital não cria o direito subjetivo à nomeação, respeitando a sistemática da repercussão geral do Tema 784. De igual forma, o texto, ora apresentado, também não cria esse direito, respeitando a sistemática da tese, pois apenas proíbe, independentemente de prazo de validade ou prorrogação, a abertura de novo concurso para o provimento do mesmo cargo, quando há aprovados, ainda não convocados, ou quando há aprovados no cadastro de remanescentes.
Importante frisar que o fato de a cláusula de barreira ser regulada por um decreto do Poder Executivo assegura ainda mais a legitimidade do PL. Isso porque, dentro da lógica de construção do ordenamento jurídico, as normas são escalonadas de forma hierárquica, de modo que a Lei ocupa posição superior em relação aos decretos e normas do Poder Executivo, sendo necessária aprovação desta Casa de Leis.
Nesse sentido, e seguindo a máxima jurídica de “quem pode o mais pode o menos”, não restam dúvidas de que a matéria é passível de regulamentação por Lei. Ressalta-se, ainda, que o Poder Executivo poderá adequar o decreto existente, em momento posterior.
É bem verdade, ademais, que o parágrafo segundo do artigo 1º da Lei nº 15.295, de 08 de janeiro de 2014, que tratava da criação de cadastro de reserva dos aprovados em número excedente, fora vetado pelo Poder Executivo quando da sua sanção, sob a justificativa de que seria diretriz do Governo a inadmissibilidade da formação de cadastro de reserva, nos termos de algumas normas mencionadas nas razões de veto.
Nada obstante, as razões de veto foram apresentadas em janeiro de 2014, sendo certo que essa diretriz foi alterada com a publicação do Decreto nº 60.449, de 15 de maio de 2014, que também disciplina e autoriza a criação de lista de candidatos remanescentes, sendo certo, portanto, que este PL apenas assegura, em lei, a existência desse cadastro, com a ressalva de impedir a abertura de novo concurso para o provimento do mesmo cargo, quando há aprovados não convocados.
Por fim, destaca-se que estes deputados têm ciência da apresentação do PL nº 1103/2015, do Excelentíssimo Deputado Rafael Silva, que, muito embora tenha sido arquivado, contemplava alguns pontos aqui apresentados. Referida propositura, entretanto, não versa sobre a quebra da cláusula de barreira e foi protocolizada antes do precedente do STF.
Por todo o exposto, pedimos o apoio dos Nobres Pares para a aprovação da presente proposta.
Sala das Sessões, em 18/8/2022.
a) Janaina Paschoal – PRTB a) Adriana Borgo – AGIR a) Agente Federal Danilo Balas – PL a) Conte Lopes – PL a) Coronel Nishikawa – PL a) Coronel Telhada – PP a) Delegado Bruno Lima – PP a) Delegado Olim – PP a) Douglas Garcia – REPUBLICANOS a) Leticia Aguiar – PP a) Rafael Silva – PSD
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