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Justiça, harmonia e portador de necessidades especiais

De modo geral, nenhum concurso deve criar discriminações entre os candidatos, que têm direito a uma disputa isenta e isonômica, sem privilégios de qualquer natureza.

Redação
Publicado em 12/11/2014, às 17h06

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Fernando Bentes

De modo geral, nenhum concurso deve criar discriminações entre os candidatos, que têm direito a uma disputa isenta e isonômica, sem privilégios de qualquer natureza.

No entanto, o princípio da igualdade substancial aponta um outro sentido. Quando a diferença entre as pessoas causa uma inferioridade, o Estado deve atuar prevendo um tratamento especial, que tende a estabelecer uma situação de equilíbrio ou de amparo específico.

Gestantes e idosos não podem ficar em pé por muito tempo devido à sua condição de saúde, por isso, têm atendimento preferencial em filas de bancos ou repartições públicas. Já se fizerem um concurso, não têm direito a cotas, porque a idade avançada e a gravidez não causam uma inferioridade que justifique um auxílio maior. Do mesmo modo, não há porque beneficiar os negros em filas, mas eles gozam decotas em universidades públicas como um meio de contrabalançar todas as circunstâncias de adversidades causadas pelo preconceito na cor da pele.

O mesmo princípio rege os concursos públicos. As vagas determinadas aos negros e deficientes têm o objetivo de facilitar sua inclusão social, tendo em vista que os primeiros sofrem discriminação e os portadores de necessidades especiais (PNEs) lidam diuturnamente com sérias dificuldades para seu desenvolvimento pessoal.

De modo geral, os concursos sempre prescrevem vagas restritas aos deficientes. Neste caso, a administração pública precisa de um serviço de natureza intelectual e, por isso, as provas avaliam apenas o conhecimento abstrato do candidato. Porém, alguns cargos também exigem um teste físico, que avalia a capacidade de o candidato cumprir tarefas mais dinâmicas. É o exemplo de concursos para fuzileiro naval, soldados das Forças Armadas e da Polícia Militar, carteiro (Correios), técnico de perfuração e poços (Petrobras), agente da Polícia Civil etc. A deficiência física dos candidatos dificulta o desempenho destas funções.

Tanto o posicionamento do Supremo Tribunal Federal quanto da Justiça Federal parecem resguardar o direito do portador de necessidades especiais. Por isso, ambas as decisões condenam a imprevisão de vagas para deficientes e a eliminação preliminar do candidato, cuja exclusão da disputa deveria ser prevista dentro do exame de aptidão física ou do estágio probatório. De um modo geral, esse comportamento demonstra uma humanização positiva do Judiciário, o que contribui para a inserção das minorias excluídas.

No entanto, é preciso avaliar alguns parâmetros, sobretudo, em relação ao princípio constitucional da eficiência, que rege a Administração Pública e fundamenta o próprio ato de realização de concursos públicos. Vedar absolutamente a participação aos portadores de necessidades especiais não é a melhor proposta, pois existem diferentes tipos e níveis de deficiência. Adaptar o teste físico ou o curso de formação a suas necessidades também não é razoável, tendo em vista que o desempenho das funções será o mesmo, para qualquer um que for aprovado. Postergar a exclusão do deficiente ao período de estágio probatório me parece a pior solução, porque a responsabilidade pela exoneração é delegada à própria administração pública, o que pode causar constrangimentos e realçar debates corporativistas ou preconceituosos, além de questionamentos judiciais intermináveis.

Acredito que o Judiciário se concentre em testar o deficiente físico no estágio probatório como um meio de lhe estabelecer uma chance para exercer o cargo. Em caso de sucesso, permanece; se não conseguir acompanhar os demais, será exonerado. Mas esta postura, que não pode ser considerada simplesmente como demagógica ou populista, também não pode desconsiderar a necessidade de habilitação física específica. Além do mais, são pouquíssimos os certames que exigem provas físicas e os portadores de necessidades especiais têm a garantia da reserva de vagas em todos os demais concursos de natureza eminentemente intelectual.

Para o arrastado concurso da Polícia Federal – suspenso em outubro para adequação das etapas considerando a participação de deficientes físicos – acredito que o critério mais harmônico deva conciliar ao máximo os princípios constitucionais da igualdade substancial e da eficiência. Assim, o edital deve reservar vagas para deficientes, que vão se submeter aos mesmos testes físicos previstos aos concorrentes em geral. Caso os primeiros colocados nas vagas para portadores de necessidades especiais não passem, serão convocados os demais. Se passarem, serão incorporados e nomeados. Caso o número de deficientes aprovados não cumpra o quantitativo pré-determinado, estas vagas podem ser redistribuídas aos candidatos da disputa geral.

Desse modo, acredito que uma importante chance é garantida, sem prejuízo de quaisquer questionamentos posteriores quanto ao mérito de aprovação.

Fernando Bentes é diretor acadêmico do site Questões de Concursos e professor de direito constitucional da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro.

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