Em live direcionada aos seus eleitores, Bolsonaro (PL), que tenta a reeleição e teve desempenho pior nas urnas, endossou os ataques feitos por quem o apoia aos nordestinos
Mylena Lira Publicado em 06/10/2022, às 18h59
Xenofobia é crime. Ainda assim, desde o último domingo, quando ocorreu o 1º turno das eleições 2022, o número de ataques contra nordestinos tem crescido, principalmente via redes sociais. As ofensas partem dos bolsonaristas porque Lula (PT) ganhou em todos os estado do nordeste e acabou sendo o mais votado para presidente, com 48,43% dos votos válidos.
Ontem (6) à noite, em live direcionada aos seus eleitores, Bolsonaro (PL), que tenta a reeleição e teve desempenho pior nas urnas (43,20% dos votos), endossou os ataques feitos por quem o apoia. Ele leu apenas o título de uma reportagem da CNN Brasil e tirou dados do contexto, inferindo que quem votou em Lula é analfabeto, ao invés de apaziguar e pedir para seus eleitores pararem de ser preconceituosos e atacar o nordeste.
"Essa notícia aqui é da imprensa e é verdadeira: Lula venceu em 9 dos 10 estados com maior taxa de analfabetismo", fala ao ler apenas o título da matéria da CNN, publicada em 3 de outubro. Na sequência, pergunta: "vocês sabem quais são os estados? Do nosso nordeste".
Logo depois, sem qualquer embasamento estatístico, pois não constava na reportagem, afirmou: "Esses estados estão há 20 anos sendo administrados pelo PT. Onde a esquerda entra leva o analfabetismo, leva a falta de cultura, leva o desemprego, leva a falta de esperança", ressaltou.
Contudo, Bolsonaro mentiu. O uso indevido e fora de contexto da notícia levou a CNN a atualizar a matéria na tarde de hoje (6). Agora consta que "durante os governos de Lula (2003-2010), a taxa de analfabetismo caiu em todos os dez estados em questão". Além disso, a emissora deixa claro que "não há comprovação da correlação entre a métrica e a escolha dos eleitores. Além disso, o voto é facultativo para analfabetos no Brasil".
Veja abaixo o vídeo no qual Bolsonaro faz a afirmação, divulgado pelo Estadão:
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Bolsonaro assumiu o comando do país no dia 1º de janeiro de 2019. O índice atual de analfabetismo no país é quatro vezes maior do que em 2018, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Conforme dados divulgados pelo IBGE em 8 de setembro, Dia Mundial de Alfabetização, o Brasil tinha aproximadamente 11 bilhões de analfabetos quatro anos atrás. Agora, esse número subiu para mais de 14 bilhões de pessoas que não sabem ler, escrever ou realizar as operações básicas de matemática.
Vale ressaltar que o analfabetismo é maior entre os idosos, que lá atrás não tiveram acesso à educação ou precisaram priorizar o trabalho e, hoje em dia, têm mais dificuldade em retomar os estudos.
Além disso, de acordo com o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), 87 das 100 melhors escolas públicas do Brasil nos anos inicias do ensino fundamental (1º ao 5º ano) estão em um estado do nordeste: o Ceará. O dado é do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) 2021 e foi divulgado nem 16 de setembro deste ano.
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Só neste ano, o governo Bolsonaro cortou o uso de R$ 2,4 bilhões de recursos do MEC (Ministério da Educação). O último bloqueio foi anunciado ontem (5) e vai retirar investimento dos institutos e universidades federais.
A Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior) emitiu nota na qual ressalta que a redução da verba da Educação inviabiliza o funcionamento de muitas universidades federais. "Este valor [bloqueado ontem], se somado ao montante que já havia sido bloqueado ao longo do ano, perfaz um total de R$ 763 milhões em valores que foram retirados das universidades federais do orçamento que havia sido aprovado para este ano", diz.
Basta olhar os comentários nos posts sobre o resultado do 1º turno das eleições 2022 para se deparar com inúmeros xingamentos e ataques ao povo nordestino. Entre as principais ofensas estão as que afirmam que "depois vem para o sul e sudeste procurar emprego" "depois vem vender rede aqui", "o nordeste merece voltar a carregar água cem balde" e "gostam de viver de milhadas".
O humorista Whinderson Nunes, natural do Piauí, chegou a discutir no Twitter após ofensa de um seguidor. “O Nordeste não produz nada para o país, só quer dinheiro fácil, uma pena. Uma terra rica, porém o pessoal quer o mais fácil, a migalha do PT já deixa eles felizes”, disse o seguidor.
Na sequência, Whinderson respondeu: “’Vocês tentam esconder, mas você vê todo um povo gente boa demais, trabalhador demais, como ‘pessoas que querem dinheiro fácil’ ou que ‘não produz nada’. O Nordeste não é sua empresa, não preciso mais construir calçadas pra você andar. Fodam-s*’”, ressaltou o humorista.
A discriminação do migrante nordestino é xenofobia e a atitude se enquadra no crime de racismo, que é inafiançável e tem pena de dois a cinco anos de reclusão e multa, conforme prevê a Lei nº 7.716/1989. O criminoso que pratica racismo contra um grupo de pessoas de determinada região do país pode, ainda, ser obrigado a fazer reparação por danos morais coletivos.
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