18.
Não é usual tratar da política na perspectiva daafirmação da verdade. Platão afirmou, na República, que averdade merece ser estimada sobre todas as coisas, masressalvou que há circunstâncias em que a mentira pode ser útil,e não odiosa. Na política, a derrogação da verdade pelaaceitação da mentira muito deve à clássica tradição do realismoque identifica no predomínio do conflito o cerne dos fatospolíticos. Esta tradição trabalha a ação política como uma açãoestratégica que requer, sem idealismos, uma praxiologia, vendona realidade resistência e no poder, hostilidade. Neste contexto,política é guerra e, como diz o provérbio, "em tempos de guerra,mentiras por mar, mentiras por terra". Recorrendo a metáforas do reino animal, Maquiavelaponta que o príncipe precisa ter, ao mesmo tempo, noexercício realista do poder, a força do leão e a astúcia ardilosada raposa. Raposa, leão, assim como camaleão, serpente,polvo – metáforas que frequentemente são utilizadas nadescrição de políticos – não podem, com propriedade,caracterizar o ser humano moral que obedece aos consagradospreceitos do "não matar" e do "não mentir", como lembraNorberto Bobbio. No plano político, o realismo da força torna límpida,numa disputa, a bélica contraposição amigo-inimigo. Já orealismo da fraude é mais sutil, pois opera confundindo eaumentando a opacidade e a incerteza na arena política, comoacentua Pier Paolo Portinaro. Maquiavel salienta que a fraude émais importante do que a força para assegurar o poder econsolidá-lo. É por esse motivo que a simulação, o segredo e amentira são temas da doutrina da razão de Estado e averacidade não é usualmente considerada uma virtudecaracterística de governantes. Sustentar a simulação e a mentira como expedientesusuais na arena política é desconhecer a importânciaestratégica que a confiança desempenha na pluralidade dainteração humana democrática. A confiança requer a boa-fé quepressupõe a veracidade. O Talmude equipara a mentira à piorforma de roubo: "Existem sete classes de ladrões e a primeira éa daqueles que roubam a mente de seus semelhantes atravésde palavras mentirosas." O padre Antônio Vieira afirmou que averdade é filha da justiça, porque a justiça dá a cada um o que éseu, ao contrário da mentira, porque esta "ou vos tira o quetendes ou vos dá o que não tendes". Montaigne observou quesomente pela palavra é que somos homens e nos entendemos.Por isso mentir é um vício maldito. Impede o entendimento.
(Celso Lafer. O Estado de S. Paulo, A2, 20 de julho de 2008, com adaptações)
18. Considere o emprego de sinais de pontuação no texto.
I. e no poder, hostilidade – a vírgula assinala elipse do verbo.
II. – metáforas que frequentemente são utilizadas na descrição de políticos - os travessões isolam segmento explicativo.
III. aos consagrados preceitos do "não matar" e do "não mentir" - as aspas indicam reprodução exata de princípios estabelecidos.
IV. equipara a mentira à pior forma de roubo: - os dois pontos indicam intervenção de novo interlocutor no contexto.
Está correto o que se afirma em
Resposta: