Luiz Flávio Gomes analisa os aspectos do direito e da moral envolvidos no polêmico jogo do Palmeiras pelo Campeonato Brasileiro de futebol
Redação Publicado em 06/11/2012, às 15h56
Luiz Flávio Gomes
Ingerência externa (recursos tecnológicos externos) pode influenciar no resultado de uma partida de futebol? Pode anulá-la? Ela é proibida pela Fifa. O assunto está em pauta porque o Palmeiras impugnou o resultado do jogo contra o Inter (partida de 27/10/12), pedindo no STJD (Superior Tribunal de Justiça Desportiva) a anulação da conduta do juiz que invalidou um gol (feito por Barcos, com a mão).
Do ponto de vista jurídico realmente o árbitro não pode se valer de recursos externos para sua atuação. Se isso ocorreu, houve irregularidade na conduta do árbitro (de acordo com as regras do futebol). Tudo, no entanto, é uma questão de provas.
O Palmeiras não pretende, no entanto, só fazer valer as regras vigentes. Seria louvável sua atitude se estivesse pedindo somente alguma punição para o juiz, por ter fugido das regras do esporte. Mas não é isso não.
Ele quer ver reconhecida a irregularidade do ato (que ainda depende de provas) e, mais do que isso, pede um segundo jogo e tudo com base num lance ilegal (gol feito com as mãos). Primeiro veio a torpeza do jogador (gol feito com as mãos). Agora quer a equipe reclamante se valer dessa torpeza para se beneficiar de um outro jogo (uma nova chance de se apresentar melhor em campo).
Aqui a imoralidade é patente, assim como a falta de ética. A regra número um da ética é a seguinte: não faça mal aos outros, não cause danos aos outros, não ofenda os outros (ou seja: respeite todas as demais pessoas).
Quem se vale de sua própria torpeza ou malandragem (torpeza de um membro da equipe) para prejudicar os outros (os demais times interessados no resultado da partida) pratica uma conduta aética e imoral. Se você sabe que uma coisa é errada e mesmo assim a admite (buscando inclusive alguma vantagem) você está fazendo algo imoral. Quem decidiu questionar a partida para, valendo-se de torpeza própria, tentar buscar alguma vantagem, busca na verdade uma imoralidade. Claro que não podemos censurar o advogado, que está apenas tentando fazer cumprir as regras jurídicas.
Mas as regras jurídicas, nesse caso, estariam em desacordo com a moral e a ética? A única interpretação possível (para conciliar as duas coisas) seria a seguinte: analisar o respeito ou não às regras jurídicas (uso ou não de recursos externos): caso tenha havido infringência delas, que se puna o árbitro da partida e só. Não se pode validar um gol ilegal e imoral. Não se pode anular uma partida com base numa imoralidade.
Como juiz, eu não faria mais do que isso, ou seja, eu não permitiria nova partida nem validaria o gol imoral, porque isso significaria conceder benefícios a uma torpeza (malandragem) praticada por membro da própria equipe que questiona a conduta do árbitro. Por mais tristes que sejam as consequências do nosso veredito para os palmeirenses, não podemos esquecer o que diz um velho aforismo da cultura jurídica: “Ninguém pode ser beneficiado com a própria torpeza”.
Luiz Flávio Gomes é jurista e professor; fundador da Rede de Ensino LFG; diretor-presidente do Instituto Avante Brasil e co-editor do www.atualidadesdodireito.com.br. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), juiz de Direito (1983 a 1998) e advogado (1999 a 2001). www.professorlfg.com.br / Twitter: @professorLFG