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Profissionais de concursos colocam Cespe/UnB em xeque

O objeto em questão é o novo sistema proposto pela banca para avaliar os candidatos inscritos em grandes concursos.

Redação
Publicado em 08/06/2012, às 15h55

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O Centro de Seleção e de Promoção de Eventos da Universidade de Brasília (Cespe/UnB) pretende implantar, a partir do segundo semestre deste ano, sistema informatizado para avaliar os inscritos em concursos públicos. 
Conhecido como CAT, na sigla em inglês, o padrão de Testes Adaptativos Computadorizados está em uso nos Estados Unidos há cerca de dez anos, e demorou três anos para ser adaptado pela banca às necessidades brasileiras. “O CAT se utiliza da chamada Teoria da Resposta ao Item (T.R.I.), que é a mesma utilizada no Enem (Exame Nacional do Ensino Médio). Nele, é criado um banco de itens e estabelecida uma matriz sobre o que pretende ser analisado, por meio da utilização de descritores. Os descritores são parâmetros definidos para cada questão, aptos a relacionar a habilidade do candidato sobre o assunto e a buscar, no banco de dados, a questão mais apropriada para dar continuidade à avaliação”, explica o coordenador de pesquisas em avaliação do Cespe/UnB, Marcos Vinícius Araújo.
De acordo com a lógica seguida pelo sistema, não haverá uma sequência de perguntas comum a todos os candidatos. “Aos pesquisadores coube a função de elaborar um algoritmo, que é o “cérebro”, a inteligência do processo e também o responsável por calcular todo o desempenho durante a realização do teste. O candidato responde à questão e as próximas perguntas são atribuídas de acordo com todo o histórico de respostas. No fim, surge o grau de proficiência, que determina a aptidão do indivíduo a realizar tais e tais tarefas”, revela Araújo.
Segundo o coordenador, a avaliação pelo nível de proficiência não permitirá a divulgação do gabarito. Depois de assinalar as respostas que julgar corretas, o concursando não poderá rever a prova e nem interpor recursos. “Uma vez respondida a questão, o candidato não terá mais acesso a ela, até porque prejudicaria a proficiência do participante ao final. Os gabaritos não serão mais disponibilizados. Ao final, o candidato saberá sua pontuação, mas não a dos outros. Nessa metodologia, se pressupõe que não haverá a possibilidade de recursos porque todas as questões já estarão exaustivamente testadas e calibradas. É como no Enem, onde não há gabarito, nem ambiguidade”, diz. 
A privação ao direito de interpor recurso é apenas um dos pontos polêmicos que envolvem o sistema a ser adotado pelo Cespe. A lista se estende às preocupações quanto à segurança – devido à ação de hackers, vírus e instabilidades no sistema; armazenamento das provas; logística e abrangência de aplicação das avaliações; manutenção ou redução no valor das taxas de inscrição, entre outras dúvidas.
Cheia de benefícios ou desvantagens, dependendo do prisma em que o olhar e a visão de mundo alcançam, a nova tecnologia é uma quebra de paradigmas que permite romper com a estrutura de concursos públicos até então conhecida pelo candidato. Cabe aos concursandos analisarem a proposta, tirarem conclusões e tomarem seu lugar na questão para que, mais na frente, possam comemorar ou lutar pelo que acreditam.
Confira as considerações feitas por três especialistas em concursos sobre o uso da nova tecnologia pelo Cespe.
Sérgio Camargo, advogado especializado em concursosParece que o sistema já vem sendo utilizado nos Estados Unidos há uma década, apresentando bons resultados. Creio que o CAT traga benefícios por certo, mas há importantes malefícios que devemos levar em conta, de acordo com o momento socioeconômico que o Brasil vive. 
Os EUA têm forte tradição na implementação dos direitos humanos, protegendo seus cidadãos sobre a égide dos princípios fundamentais, que nossa carta constitucional também positivou no artigo 5º. Chamo a atenção para os princípios da publicidade e da ampla defesa que, reitero, são princípios fundamentais da dignidade da pessoa humana, os quais nosso país se comprometeu a implementar desde 1789 e, depois, em 1948, com a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. 
Porém, o próprio coordenador esclarece que o sistema não permitirá publicidade, no sentido de o candidato obter suas respostas e a própria prova por ele feita; e mais grave ainda, não haverá possibilidade de recursos, mitigando-se o princípio fundamental da ampla defesa. Por mais moderno que possa ser o CAT, entendo, salvo outro juízo, que essas duas referências coloquem o sistema em situação de constitucionalidade duvidosa, por mitigar dois princípios fundamentais que os operadores do direito em nosso país vêm lutando para reforçar, e por que não sermos transparentes ao dizer que ainda não se consolidaram? 
Em relação à impossibilidade de recursos, entendo que o sistema traduza modalidade de Acessibilidade Pública Inconstitucional, e faço votos que possa vir a representar candidatos no judiciário brasileiro, questionando esta clara violação à dignidade da pessoa humana. 
Posso dizer, então, que vejo com sinceras reservas esta modalidade de avaliação, que por mais que possa representar avanço tecnológico, por certo representará retrocesso social, num país que luta embrionariamente para firmar-se como um real Estado Democrático de Direito.

Leonardo Pereira, diretor do Instituto IOBO CAT é colocado como sistema de análise de aptidões e não como sistema hábil a avaliar o grau de conhecimento de um candidato em relação ao outro, o que ainda denota ser uma falha do sistema que o CESPE pretende adotar. O resultado de proficiência elimina por completo a transparência do exame. É um verdadeiro absurdo!
Outra questão é que, ao viabilizar que provas para um mesmo grupo de candidatos possam ser aplicadas em momentos distintos, permitimos que candidatos estudem mais, que tenham mais tempo de se prepararem, quebrando a isonomia perseguida. A lisura do processo não é questionada entre candidatos, mas sim da banca examinadora em relação ao benefício de uns em detrimento de outros, seja qual for a banca. Haverá tempo para desenvolvimento de uma tecnologia mais robusta, apta a transmitir segurança aos candidatos já no estimado semestre que vem? Não seria melhor começar o processo e os testes em certames menores e mais concentrados?
Quanto ao valor da inscrição, há algum tempo não vejo, mesmo para os cargos de nível médio, a média de R$ 30. Bem mais caras, poderiam sim ter seus valores reduzidos com o fim da necessidade de impressão das provas. Não seria mais razoável pensar deste modo? Se é um benefício, deve trazer vantagens para todos os envolvidos.
O sistema também prevê redução no tempo para realizar as provas. Sempre que um novo edital é publicado, os especialistas preocupam-se em analisar o tempo médio para realização de cada uma das questões, considerando ainda o tempo que será gasto para transcrição do edital. Mantendo-se essa média, e acrescido o tempo médio para marcar a questão no sistema, não entendo que o candidato deva se preocupar. Estamos falando de uma redução que não pode superar meia hora para as provas de aproximadamente 100 questões. 
No entanto, comparar concurso público com Enem não dá amparo para a quebra abrupta de paradigmas que está sendo proposta. São análises diferentes e que não tem embasamento, mas concordo quando o especialista diz que a prova não é restritiva. A informática é uma realidade dos nossos tempos.

Paulo Estrella, diretor pedagógico da Academia do Concurso Não vejo problema nenhum da prova ser feita aos poucos. Em um concurso com um milhão de candidatos, você não precisa ter um milhão de computadores conectados. A ideia é fazer essa prova ao longo de um tempo, supondo que o sistema vai medir e avaliar bem o candidato.
O problema é pensar em um concurso público sem possibilidade de recursos porque as questões foram exaustivamente testadas. O exaustivamente testado me preocupa, porque quem é que diz que foi testado? Quem vai validar essas questões? Quem é que vai ter o poder divino de dizer se essas questões funcionam ou não? 
Hoje, quem faz isso, quem reclama pelos direitos é o candidato, que é o maior interessado. E a banca vai filtrar o que é pertinente e o que não é pertinente para resolver. Fazendo isso, a banca perde um monte de problemas: a prova e o processo seletivo ficam, para o candidato, muito mais obscuros, porque ele faz uma prova e não sabe se acertou ou se errou a questão, não cresce na prova, não aprende mais com os erros, quer dizer, ele não pode questionar o resultado, não pode questionar a interpretação do resultado e nem sabe qual é a interpretação que foi dada, então o candidato perde transparência, a prova perde transparência e fica sujeita a manobra interna. E não divulgando o gabarito, a banca pode utilizar a mesma questão 20 vezes, e em cada prova aceitar como verdadeiro um gabarito diferente. Ou seja, como vamos saber qual a linha de pensamento que a banca está seguindo?
Barateou o processo, mas a organizadora vai continuar alegando que tem que pagar aluguel de máquina, o que aumenta o preço. Isso não vai reduzir a taxa para o candidato. 
Quanto à segurança, para mim as questões do vírus e do hacker são as mais importantes. É uma preocupação da banca, porque se um vírus entrar no sistema e comprometê-lo, todos os dados serão perdidos e uma nova prova terá de ser feita.
Eu não estou aqui criticando o processo eletrônico, que é uma fatalidade e a única forma de reduzir custo, mas o que não pode acontecer é a perda de transparência. Esse modelo tem que permitir que o candidato avalie a prova e o desempenho em relação aos companheiros, permitir o questionamento de uma resposta numa prova e a divulgação do gabarito. Isso é abrir uma discussão mais ampla para todo mundo poder participar, envolvendo mais gente para poder garantir e avaliar possibilidades de, mesmo informatizando a prova, garantir que o candidato continue sendo o controlador do processo.
Pâmela Lee Hamer
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