Diz o senso comum, e o sucesso desse jornal trintão é prova disso, que o concurso público é a porta de entrada para a estabilidade profissional e a harmonia financeira. E se você, com nível superior, que lê essas linhas, se deparasse com um edital em que a remuneração prevista para a sua atividade fosse o correspondente a um salário mínimo? Bruna Migues, jornalista, santista – em referência ao time e a cidade que exportaram Pelé – e concurseira, decidiu protestar quando viu que a Prefeitura de Guaratinguetá, cidade localizada a 175km da capital paulista, oferecia R$ 545 aos jornalistas aprovados no processo seletivo que ainda está em andamento.
Bruna não ia prestar esse concurso. E essa decisão não foi influenciada pelo baixo salário ofertado a um profissional com nível superior. “Uma faculdade de jornalismo custa, ao menos, R$ 700”, pontua Bruna mesmo ciente que justificativas são desnecessárias.
Ela procurou o sindicato dos jornalistas que, apesar de reconhecer que as prefeituras não são obrigadas a obedecer aos pisos salariais acordados com os sindicatos, interveio no caso. A Justiça foi acionada e a Prefeitura do município obrigada a retificar o edital aumentando o salário para os jornalistas. Os profissionais que concorrem a essas vagas naquela cidade podem, por meio desta coluna, conhecer seu anjo da guarda.
Mas a questão, segundo Bruna, é de respeito. E isso tem a ver com Obama. Isso mesmo. Para entender essa postura da jornalista que vibra com os gols de Neymar e Ganso, é preciso abordar o período em que Bruna esteve nos Estados Unidos. Período em que testemunhou in loco a eleição mais midiática e cativante da democracia moderna.
Bruna deixou-se maravilhar pela capacidade de engajamento dos americanos. “Eles apóiam mesmo; saem às ruas para angariar verbas e fazer campanha”. Há quem acredite que o Brasil, além de ser o país do jeitinho, é o reino do conformismo. Bruna trabalha contra essas convicções. “Lá, para eles o que é certo é certo. Sempre tentei ser muito justa. Sou muito metódica e, de certa forma, acho que a experiência aumentou isso em mim”, teoriza sobre o próprio inconformismo.
E foi uma boa dose de inconformismo que levou a jornalista aos Estados Unidos. “Eu trabalhava em Santos, em uma afiliada da rede Globo, mas decidi pedir as contas e experimentar”, narra o início de sua jornada. Foram dois anos no país de Obama, Brad Pitt e Michael Jordan. O intenso processo cultural se deu também por meio de cursos e convivência com jornalistas americanos. Texas, Washington e Nova Iorque foram alguns dos lugares que acresceram sentido à viagem. Mas quando Bruna voltou ao Brasil com um currículo envernizado na bagagem, a realidade do mercado de trabalho brasileiro a aturdiu.
“É tão difícil arranjar emprego”, desabafou como se o peso da angústia sozinho tivesse os 28 anos que, na verdade, são de Bruna. Como tantos brasileiros, a recém-regressa à terra amada vislumbrou nos concursos públicos um oásis de estabilidade em uma economia que, embora pujante, para os cidadãos mais parece uma nau portuguesa à deriva.
Foi aprovada logo na primeira tentativa. Um estímulo e tanto para a experimentadora por natureza. Natureza e experimentação são palavras que provocam memórias em Bruna, como a do “mochilão” que fez pela América Latina. De volta aos concursos, a aprovação na Agecom – órgão vinculado ao governo de Goiás – foi para cadastro reserva e Bruna permanece na espera. Mas só nesse cadastro, porque na famigerada “luta pela carreira pública”, a jornalista agarrou-se às armas – no caso os livros. Fez cursinho durante um tempo, mas se achou estudando sozinha; e pôs–se a prestar concursos: Correios, Câmara Municipal de Valinhos e alguns outros que a memória nega a lembrança. Isso tudo porque faz um ano e meio que o país de Dilma tem Bruna de volta a seu seio. Há dois concursos no horizonte: Empresa Brasileira de Comunicação e Assembleia Legislativa do Estado do Espírito Santo. Sempre com o cargo de jornalista como objeto de cobiça. Atualmente, Bruna trabalha na TV Cultura em São Paulo. Mas segue buscando. Ela se despede satisfeita com a entrevista e deixa transparecer que a satisfação profissional é sua odisséia particular. Roubando o slogan do Obama, convém dizer: yes she can!
Por Reinaldo Matheus Glioche
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