Artigo sobre marketing, mercado e trabalho
Arquitetos, escritores, comunicadores, palestrantes, atores, coreógrafos, decoradores, estilistas, músicos, designers, tatuadores, programadores, gamers, quadrinistas. Nunca houve uma valorização tão grande das profissões artísticas e criativas e nunca houve uma estetização tão grande de profissões que, originalmente, pareciam não ter relação alguma com arte e criação: cabeleireiros reconhecem-se como hair designers, cozinheiros como culinaristas e jardineiros como paisagistas. Até homens de negócios são vistos hoje mais como artistas visionários e gurus do que como administradores e líderes organizacionais. Arte e criação são o novo negócio!
Hoje, as empresas de entretenimento ou entertainment, como têm sido chamadas, vêm impressionando nos hankings de faturamento por todo o globo. Desde 2010, o peso das indústrias culturais para o comércio exterior dos Estados Unidos supera setores de base e fortemente estruturados, como automobilismo, aeronáutica e química. Todos hoje querem ser membros do elenco, e os autores Lipovetsky e Serroy, explicam por quê. Segundo sua mais recente obra, lançada em 2015, o mundo está vivendo um processo de estetização através do qual profissões, produtos e espaços adquirem uma aura artística e criativa. Para os autores, o atual estágio do capitalismo, batizado como “capitalismo artista”, cria empresas que possuem um polo econômico e um polo artístico, ambos trabalhando em conjunto para a maximização dos lucros. Nessa macro tendência, cedo ou tarde, todos trabalharemos no show business.
Além dessa tendência mercadológica, trampolim para uma verdadeira profissionalização das competências artísticas e criativas, há também um ímpeto, entre os jovens profissionais, que impulsiona essa estetização das profissões: ganhar dinheiro não basta mais, eles sonham em ter um trabalho livre, expressivo, estimulante, personalista e não rotineiro. Seria o capitalismo artista seu passaporte para viver isso? Infelizmente, a resposta não é tão simples como sim ou não.
Sem dúvida, nosso atual contexto econômico cultural vem contribuindo largamente para a democratização da ambição de criar, pois difunde a concepção de que “qualquer um pode desenvolver a habilidade criativa”, desmistificando-a e tornando seu acesso cada vez mais irrestrito dada a multiplicação de postos de trabalho oferecidos a essa classe criativa. Portanto se o indivíduo busca uma profissão artística, expressiva e menos rotineira, este parece um momento mais do que favorável. O problema é que muitos buscam, nas carreiras artísticas, não só expressão, autonomia e arte, buscam fama. Aliás, para alguns, sucesso profissional e fama caminham juntos. E vale dizer que, para alcançar fama, o ambiente nunca foi tão desfavorável.
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Hoje, os criadores passaram a ser admirados como profissionais sedutores, populares, celebridades capazes de conceber ideias e experiências singulares. Conhecemos quadrinistas, culinaristas, escritores, atores, arquitetos globalmente conhecidos, fontes de uma fama realmente milionária. Porém quanto maior é a oferta de profissionais criativos, mais concentrado é o sucesso ligado a essas carreiras. Ou seja, cada superstars fabricado fatalmente gera uma fila com milhões de anônimos atrás dele, por isso buscar a fama como concepção de sucesso na carreira pode ser frustrante. Esse fenômeno nada tem a ver com competência, entre os anônimos há profissionais totalmente talentosos e capazes, ele existe porque os superstars, os best-sellers e os recordes de bilheteria só são super, best e record porque ocorrem em pequeno número, e a condição para continuarem tão vertiginosamente lucrativos é manterem sua aura exclusiva e rara.
Nesse contexto, a chance de alcançar fama é de fato mínima, porém a perspectiva de desenvolver um trabalho criativo, expressivo e estimulante é real e a democratização do acesso ao artístico e ao criativo enquanto profissão, hoje possível como em nenhum outro momento, trouxe a valorização dos criadores como homens de negócios talentosos e líderes organizacionais necessários, o que só representa ganhos para as empresas e para seus colaboradores. Não só o meio corporativo, mas toda a sociedade humana se beneficiará com tal valorização, pois ela vai além, representando um salto intelectual para o homem. Teremos mais soluções criativas, maior autonomia e sobrevida quanto mais formos capazes de incentivar o desenvolvimento da habilidade de criador (e não de mero reprodutor), nas gerações que surgem.
Kate Domingos é publicitária pela USP, docente e consultora em Marketing e Comunicação. Contato: kate@concrie.com
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