No artigo desta semana, o colunista Gabriel Granjeiro nos conta o desafio de se manter equilibrado diante da guerra interna que acontece dentro de nós
Eu, tido por muitos como alguém calmo, paciente e ponderado, poucos dias atrás perdi a cabeça e acabei não me dirigindo com o melhor tom a uma colaboradora. Logo me arrependi e lhe pedi perdão, mas sei que ela provavelmente carregará para sempre uma ferida, mesmo que pequena, depois do que aconteceu.
Afinal, é assim com todos que passam por uma experiência desse tipo, não é?
Seja como for, o infeliz episódio me inspirou a escrever este texto. Refletindo sobre o assunto, de súbito algo ficou claro para mim. Percebi que todos estamos em constante duelo interno.
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Dentro de nós, há um embate contínuo entre aspectos não raro completamente antagônicos de nossa personalidade. Eventualmente esses extremos se chocam para valer. Quando isso acontece, temos de redobrar a atenção a fim de que se sobressaia nosso lado bom. Do contrário, podemos, nós mesmos, nos tornar nosso pior inimigo.
Acredito no ser humano. Mesmo. Somos extremamente complexos, e penso que todos temos um lado bom, gentil, iluminado. Para alguns, é ele que predomina. Ainda bem.
Todavia, também acho plausível que carreguemos na alma algo de negativo, de impaciente, de ruim. Um passageiro sombrio, entende? É bíblico. Paulo, na Epístola aos Romanos, disse: “Porque não faço o bem que eu quero, mas o mal que não quero, esse faço. Mas, se eu faço o que não quero, já não sou eu quem o faz, e sim o pecado que habita em mim.”
Felizmente, os extremos, embora existam, são raros. Mais comum é o meio-termo, algum lugar no meio do caminho entre o bem e o mal. Às vezes, por um descuido, nosso passageiro sombrio vence o duelo momentâneo e desata a proferir palavras ácidas ou a fomentar discórdia ao nosso redor.
Em resumo, cometemos alguns erros ou agimos com destempero uma vez ou outra, mas logo voltamos ao normal. O fato é que ninguém falha porque quer falhar. Se agimos mal, provavelmente foi porque nos parecia certo na hora.
Veja, importa mesmo é o que você é de verdade e o que se propõe a fazer, ainda que o resultado dos seus esforços não seja exatamente o que você esperava. O que interessa é tentar, e logo. Há, sobre isso, uma bela lição atribuída ao imperador Marco Aurélio: “Não se comporte como se estivesse destinado a viver para sempre... Enquanto você viver e enquanto puder, seja bom agora”. Em outras palavras, não se programe para ser bom na segunda-feira ou no início do ano que se avizinha; seja bom aqui e agora.
A alegria, a tranquilidade, o sono perfeito, a paz de espírito, a felicidade, tudo isso depende das escolhas que fazemos, pois são elas que determinam quem vencerá nosso próximo duelo interior. Percebe como é importante estar à frente das decisões? A mesma pessoa que tem o bônus da escolha, também tem o ônus das consequências dela.
Tudo funciona mais ou menos como um jogo de cartas ou de dominó: a vitória depende diretamente do que decidimos fazer com a mão de cartas ou de pedras que recebemos. Fica a dica: todo dia, ao acordar, decida ser o mais humano possível nas próximas horas. Até porque, como ensina Sêneca, “onde houver um ser humano, há uma oportunidade para a gentileza”.
Ah, e renove essa disposição em fazer o bem sempre que puder. Fique atento, seja intencional e – importante – conheça bem a si mesmo. Não me considero fácil de ser tirado do sério, mas já tenho experiência suficiente para reconhecer os meus gatilhos (acredite: nem sempre precisa ser algo muito intenso como alguns supõem).
Sabe, não existe fórmula mágica; apenas um lento e contínuo processo de autoconhecimento permite compreender nossas particularidades. Identifique as situações que despertam sua impaciência, perceba quando você começa a falar algo ruim sobre alguém ou a subir o tom com seu interlocutor, atente para manifestações de indisciplina ou procrastinação. Habitue-se a esse esforço diário para ser a sua melhor versão.
Por fim, opte por fazer o bem não porque agir assim lhe dá prazer, mas porque é o certo. E não espere nada em troca por suas boas ações, encontrando motivação em si mesmo em vez de em alguma recompensa. Quando notar que o seu lado iluminado venceu o sombrio, por favor, nada de sair gritando aos quatro ventos seu “grande feito”.
Simplesmente passe à ação seguinte, da mesma forma que uma videira produz novos cachos sem saber o destino das uvas colhidas na estação anterior. Fazer o bem é apenas a nossa função, está em nossa natureza. “Muitas vezes a injustiça reside no que você não está fazendo, não apenas no que você está fazendo”, diria o imperador Marco Aurélio.
É do nosso instinto de autopreservação nos mantermos longe do que nos parece ruim e perto do que percebemos como bom. Alguém precavido refletiria como Epiteto: “Espere um pouco, impressão: deixe-me ver quem você é, e qual é sua fonte; permita-me colocá-la à prova”. Estou falando em exercemos efetivo controle sobre nossos pensamentos e nossas escolhas, entende? Se todos desenvolvêssemos o saudável hábito de, antes de tomar uma decisão, analisar bem o quadro e refletir sobre nossas opções, a possibilidade de agir mal seria significativamente menor.
Se você for conseguir se desvencilhar da primeira – e muitas vezes equivocada – impressão e tiver só um pouco de paciência, há de se tornar capaz de rejeitar até o que é irresistível para os outros. Conseguirá, assim, realizar tudo que os outros julgam impossível. Reações impetuosas são inúteis, e, já que não podemos controlar as dos outros, controlemos as nossas. Pense nisso quando sentir que forças estão duelando dentro de si.
Trabalhemos, pois, para que o nosso lado reluzente se mostre sempre superior ao sombrio. Não importa se as pessoas por aí vão notar; só o que interessa é o resultado de nossas ações para nós mesmos e os que nos são caros. A vida é muito curta para perdermos tempo com bobagem e, ao mesmo tempo, preciosa demais para aceitarmos viver passivamente e sem avançar, ainda que só um pouco, todos os dias.
Vamos juntos, tentando fazer sempre o bem e, se falharmos nesse propósito, aprendendo com o erro. Afinal, todo conhecimento é útil, mesmo aquele que é fruto de um eventual duelo interno vencido por nosso lado mais sombrio.
“Não queira que tudo aconteça como deseja. Deseje que tudo aconteça como deve acontecer, e terá serenidade.” – Epiteto
*texto de Gabriel Granjeiro, diretor-presidente do Gran Cursos Online
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