Inspirado pelos ensinamentos dos mestres Mario Sergio Cortella e Paulo Jebaili, o termo "ainda dá" é a motivação latente para não desistir dos nossos sonhos
“A única alegria no mundo é começar. É bom viver porque viver é começar sempre, a cada instante.” – Cesare Pavese (1908-1950), escritor e poeta italiano
Sabe quando você acha que chegou ao limite? Quando as coisas têm dado tão errado que desistir parece inevitável? É para horas como essas que vale a pena ter internalizado um modelo mental cuja base é a força da persistência. Essa ideia me surgiu ao ler o ótimo “Ainda dá”, de Mario Sergio Cortella e Paulo Jebaili.
Em São Paulo para uma reunião, vi um exemplar de longe e pensei: vai render um artigo. Dito e feito. Então, por justiça e em agradecimento, registro, desde logo, que muito do que você vai ler nas próximas linhas foi extraído da obra. Exerço, aqui, papel de mensageiro de bons conteúdos dos quais tomo conhecimento, cumprindo uma obrigação que tenho para com você. Logo, se quiser elogiar alguém, peço-lhe a gentileza de fazê-lo direcionando as palavras aos dois mestres.
Então vamos lá. Você tem algum amigo muito, muito persistente? Persistente do tipo que se obriga a avançar mais um pouco, fazendo aquele esforço final na busca por um resultado que seria impossível de alcançar se ele se contentasse em agir como a média da população? Persistente como o concurseiro que vai até o último segundo do tempo de prova para tentar responder inclusive as questões que um candidato menos comprometido deixaria para trás? Ou comparável ao jogador de futebol que persegue uma bola aparentemente perdida e depois cruza para o atacante marcar o gol?
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O “ainda dá” é o denominador comum dessas situações, algo que renova o ânimo de quem se vê numa provação. Remete ao estado da alma do sujeito que, mesmo quando tudo parece perdido, se vê inclinado a insistir mais um pouco. Enquanto alguns se conformam e entregam os pontos, outros pensam: ainda dá.
Como explicam Cortella e Jebaili, essa energia que alimenta nossa perseverança pode vir de dentro ou de fora. No primeiro caso, nós mesmos, sabendo bem quais são nossos propósitos e intenções, conseguimos acionar sozinhos essa espécie de dispositivo capaz de fazer ressurgir em nós a determinação (quase) perdida.
Na segunda hipótese, o mote “ainda dá” pode se manifestar de diversas formas, em frases pronunciadas por alguém que queira nos ajudar. “Seja imparável!”, “Persiga o seu sonho!”, “Busque a aprovação!”, “Sai, pobreza!”, “Continue nesse caminho!”, “Só mais um pouco!” são algumas que ouvimos desses anjos dispostos a nos incentivar em nossa jornada.
O resultado esperado é mais entusiasmo e vigor. Uma ressalva se faz necessária, contudo: o “ainda dá” não deve servir de incentivo ao delírio, ao autoengano. Vindo de dentro para fora ou de fora para dentro, é movimento que tem de encontrar condições de viabilizar-se, ou seja, de transformar-se em realidade ou de transformar a realidade.
Isso me faz lembrar de um imparável que entrevistei em nosso canal no YouTube. Ubirajara – o Bira – sonhava trabalhar no Banco do Brasil, mas, morando na rua, não tinha apostilas para estudar, tampouco estava inscrito em algum curso preparatório. Seu trunfo era ser dedicado.
Autodidata, recorreu às bibliotecas públicas e acabou saindo do banco da praça, onde dormia, direto para o Banco, com “b” maiúsculo, do Brasil. Até chegou a cogitar prestar o concurso para o Banco Central, mas reconheceu que lhe faltavam as condições. Sendo um sonho impossível, ao menos naquele momento, nada justificava o desgaste.
O fato é que a realidade – as circunstâncias do mundo ou do indivíduo – impõe limites à força de vontade. Deve, portanto, ser respeitada. Embora o querer seja o fator que desencadeia o poder, todos devemos avaliar com sabedoria a oportunidade.
Ou seja, para evocar o “ainda dá”, é indispensável estar ancorado nos fatos e nas possibilidades concretas, e não apenas no desejo, no sonho. Sair em desabalada carreira não é sinal de persistência, mas de imprudência.
Para ilustrar essa ideia, recorro ao exemplo do jogador de tênis Roger Federer, que, aos quarenta anos recém-completados, decidiu não participar nem do Grand Slam US Open nem do restante da temporada. A dura verdade é que o atleta estava travando uma batalha contra o próprio corpo. Além do peso dos anos, vinha de uma sucessão de lesões e cirurgias no joelho. Ao desistir dos jogos, levou em conta que nas últimas partidas enfrentara tenistas que tinham a metade ou pouco mais da metade da sua idade. Em vez de insistir por insistir, Federer foi apenas prudente. Percebe a diferença?
A história do tenista também é ilustrativa da questão temporal intrínseca ao conceito do “ainda dá”. O mote só é razoável se houver, de fato, tempo para se fazer o que precisa ser feito. E, muitas vezes, ainda dá, mesmo quando nos dizem que não. Funcionou, por exemplo, com o imparável Judson Barros, que assumiu o cargo na Polícia Civil do Acre aos 55, inclusive sendo submetido ao teste de aptidão física.
Cortella observa que “existem pessoas comprometidas com o problema (ah, não dá) e pessoas comprometidas com a solução (ainda dá)”. De um lado, é gente que se concentra nas dificuldades e acaba se resignando com o fracasso; de outro, é o pessoal que vai em busca de alternativas para contornar um dado problema, persevera e, no fim, vence.
Em um concurso com mais de 1 milhão e 600 mil inscritos, boa parte dos candidatos vai se intimidar com os números assustadores, a ponto de deixar de se preparar com afinco. Outros tantos, porém, farão uma análise mais racional dos dados e concluirão que só precisam mesmo de uma única vaga. Partirão, então, para os estudos, pensarão em táticas e desenvolverão técnicas que os habilitem a vencer os poucos concorrentes realmente preparados.
Almejar algo, usar o mote “ainda dá”, pressupõe, é claro, motivação, mas de forma alguma prescinde do preparo, do planejamento, da competência na execução. Enfim, envolve mais a busca por soluções do que a atenção ao problema.
Também cabe esclarecer a diferença entre teimosia e persistência, paciência e lerdeza. Teimoso é aquele que, contra todas as evidências, segue agindo do mesmo modo de sempre; já o persistente não desiste, mas é plenamente capaz de notar o que não está saindo como esperado e de fazer ajustes sempre que necessário. A diferença está na atitude, mais ou menos inflexível, e não custa dizer o óbvio: o sucesso está mais próximo do persistente do que do teimoso.
Paciência, por sua vez, difere de lerdeza. A primeira é a capacidade de maturar e aguardar o momento certo de agir. É ter sabedoria para perceber que chegou a hora, por exemplo, de disputar cargos mais elevados. Lerdeza, por outro lado, é sinal de incompetência e preguiça. Desnecessário ressaltar como a paciência é infinitamente mais desejável, certo? Envolve racionalidade, que, como vimos, é atributo essencial quando se trata de perseverança.
Então vamos juntos, persistentes em vez de teimosos e pacientes em vez de lerdos, ainda que sofrendo reveses, enfrentando contratempos e amargando frustrações? Tenhamos esperança – do verbo “esperançar” –, porque, ao fim e ao cabo, a derrota pela circunstância é algo que acontece na vida, mas a derrota da esperança nós não podemos admitir.
*texto de Gabriel Granjeiro, diretor-presidente do Gran Cursos Online
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