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Ave Maria do Céu

O primogênito leva o mesmo nome e tem a cara da mãe, literalmente. Traz estampado seu rostinho angelical, os c

Redação
Publicado em 12/06/2007, às 11h20

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por Lygia Roncel
lygia@jcconcursos.com.br


O primogênito leva o mesmo nome e tem a cara da mãe, literalmente. Traz estampado seu rostinho angelical, os cachos escuros escorrendo pela face real e pelo ombro nu, o sorrisinho de quem esconde um segredo e uns olhos de Capitu, que não se sabe se guardam culpa ou inocência. No verso, prende os cabelos com a palma das mãos, afrouxa as rédeas dos olhos mais astutos dos admiradores mil, permite-lhes pousar em sua nuca e brincar de alforria; e, na mesma palma, mantém presos os vossos corações, reféns do seu mistério.

Sentimo-nos a sós com seu encanto, cercados por uma varanda com vista para algum recorte colorido da Pompéia, sob a manta cinza de um dia cândido - desses que não se quer arrancar do calendário e cuja luminosidade clareia as 364 noites seguintes. Nossa câmera, então, flagra suas poses preguiçosas e displicentes, e o que se revela, no silêncio de seu irresistível mistério e candura, são os sussurros mornos da sua sensualidade, que exala aroma de talco e fragrância francesa, e que, ao mesmo tempo, sopra e arde, gela e queima - firmamento e purgatório no vão de um gesto, na fenda de um olhar, que é de criança com um vulto de mulher e também o contrário.

As pintas sobre e sob os lábios, como se demarcassem onde está o seu maior tesouro, provocam-nos a sede de ouvir o que eles guardam – e os demais segredos que há ali dentro - e também a avidez em descobrir a grandeza por detrás daquelas três letras do seu nome, por cujo curto itinerário planamos demoradamente, e que, de tão poético, parece apelido de infância ou o pedaço de um soneto.

Sua beleza, porém, e toda a docilidade que exibe em sua superfície podem ser armadilha para que baixemos a guarda e ela nos vença com sua sinceridade impostora e engenhosa sedução; de tão estarrecidos e embriagados com a embalagem, talvez nos escapasse a razão quando irrompesse o conteúdo e, então, já estaríamos cegos demais para mensurar seu valor.

Contudo, o encontro com sua essência dilui nosso gérmen de suspeita, solidifica nosso deslumbre e dilata o miocárdio para recebê-la torrencialmente, entrelaçando-nos no novelo que é sua voz, quente e macia, cujas cordas ela dedilha habilmente e transforma em instrumento, uma fusão de banjo, contrabaixo e bandolim numa só garganta.

Scratches, batuques e chocalhos de maracatu e afoxé abrem alas no disco e adiam por mais um extenso minuto o sublime encontro; então, finalmente, o avesso do seu silêncio atravessa, mansa e modestamente como bolha de sabão, a penumbra dos meus tímpanos, até que estoura e se esparrama pelos meandros subterrâneos da minha sensibilidade, num jazz impulsionado por atabaque e xequerê. É "Lenda". Não ela, mas o nome da música. Uma composição que leva sua assinatura, assim como outras onze, de um total de quinze faixas. Sua rouquidão torna tudo mais sombrio e sensual, o que se intensifica pelos verbos no imperativo da letra e a atmosfera esfumaçada de fábula que ela cria acerca de si, entre romântica e ameaçadora, meio Cinderela, meio feiticeira. É assim que ela se apresenta.

Não há mais tempo nem para respirarmos antes de ela vir cheia de 'ais' em "Malemolência", mais um dos seus experimentos, que mistura agogô e cavaquinho com mais scratches e sax, e que, imediatamente, convida corpo e espírito para um baile. Adiante, as ruidosas "Roda" e "Rainha" - esta, uma divinização da África, com direito a conga e maraca, que oferecem o toque latino - abrem alas para o sexteto imbatível, que corrobora seu múltiplo talento: "10 contados", "Mais um lamento", "Valsa pra Biu Roque" - extremamente anacrônica -, "Ave Cruz", "Bobagem" e, por fim, a que pontua o disco, "Samba na sola". Todas dela, meus caros. Uma incursão pelo jazz, pelo afro, pela MPB, pelo regional, pelo eletrônico e pelo samba, não necessariamente nessa ordem, lançando mão de bongô, reco, trombone, bandolim, surdo, cavaquinho, batuque e um pouco mais dos scratches do DJ Marco, que vão e voltam numa e noutra canção, contribuindo para o som puramente contemporâneo que resulta de todo esse misto e dando outra cara e significado à tal da "nova e moderna MPB".

Quase nada, no entanto, chega a ser mais sexy do que sua voz entrelaçada aos versos melancólicos de "Concrete Jungle", como ilusionista que transforma um reggae legendário – com o peso da imortalidade de um Bob Marley – em um jazz tupiniquim movido a suspiros nossos e a agogô. Uma obra de arte reinventada por Midas ou, mais ainda, por Deus. Sublime é a palavra.

A mesma mágica ela faz com "O ronco da cuíca", produto com selo verde-e-amarelo – agora não mais da Jamaica –, subtraído do cofre de jóias da duplinha dinâmica João Bosco e Aldir Blanc, corrompido pelo hibridismo sonoro e rejuvenescido pela brisa do século vinte e um. Um achado seu. Por essa e por outras, numa terra de tantas Marias, Maria do Céu consegue se distinguir.

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