Maria Cristina Gobbi optou por desenvolver a carreira a partir de especializações, mestrado e doutorado e hoje possui reconhecimento inclusive internacional.
Era minha primeira semana na faculdade de jornalismo e seguia em direção à aula inicial de teoria da comunicação. Meus pés tocavam o piso emborrachado branco e frio, mas meus pensamentos iluminavam um outro caminho: o de um futuro como jornalista.
No trajeto até a sala, permeado pela troca de prédios, pelo contato com a área verde do campus e pelo cheiro de massa folhada e manteiga dos croissants vendidos na cantina próxima, lembrava do meu avô, que revelou o jornalismo a mim, ao permitir que eu fosse sua companheira fiel para assistir aos noticiários durante o período de férias, no único momento em que ele parava na frente da telinha, descansava seu 1,95m no sofá e deixava que as imagens entrassem pelos olhos azuis cor do mar e se instalassem no cérebro.
A concentração era tanta, que eu me perguntava se ele estaria cativado, hipnotizado ou perdido no emaranhado dos próprios pensamentos.
A ideia de que a resposta não importava mais foi interrompida pelo tilintar rápido e preciso de sapatos de salto, quebrando o silêncio de morbidade instalado naquele corredor. O olhar e os ouvidos aguçaram de curiosidade.
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De repente, surgia à minha frente uma mulher de cabelos loiros tingidos, lisos na raiz e cacheados nas pontas, pele clara, finas sobrancelhas no mesmo tom do cabelo, boca pequena e silhueta alongada pela composição harmônica entre o tronco e a cabeça miúda, apesar da pouca estatura.
Ela olhou para mim e sorriu, dando um cumprimento de boa noite; retribui. Mais tarde também entendi aquela simpatia como um chamado de boas-vindas, já que ao chegar na sala percebi que ela seria minha professora. Era o primeiro contato que tinha com a personagem que você passará a conhecer: Maria Cristina Gobbi.
Chamada apenas de Gobbi por muitos de seus alunos, essa paulistana não consegue ficar parada. Precisa ver o tempo correndo a favor e, na melhor das hipóteses, até um pouco atrasado em relação a seu ritmo frenético.
Está constantemente em busca de formas de preencher o tempo já curto, tomado pelas aulas que leciona, as orientações a graduandos em fase de elaboração do TCC, os livros que redige, o contato com a família.
Na vida dessa professora, a rotina não massacra. É um estimulante que alimenta a fome de aperfeiçoamento.
“Lecionar é aprender, não parar de estudar nunca. São muito alunos, muitas experiências, muitas demandas. Então, precisamos estar constantemente atualizados, buscando novos conhecimentos. Alio a tudo isso o prazer de dar aulas”, reforça.
A fome de conhecimento bateu primeiro no campo do raciocínio lógico. Era começo dos anos 80 e Maria Cristina Gobbi estava decidida: iria frequentar o superior em matemática.
Não demorou muito tempo para que ela sentisse na pele e no peito a escolha que tinha feito.
“Quando terminei o bacharelado recebi um convite para ministrar aulas na faculdade em que eu havia me formado. Mas achei que era uma loucura, com vinte e poucos anos, ousar entrar em uma sala de graduação e assumir o posto de professora. Meus professores eram grandes mestres. Fui então para o mercado profissional, mas aceitei o desafio de um professor e fiz licenciatura plena, também em matemática”, revela.
Em 1983, envolta no turbilhão de expectativas, naturais em toda mudança e aceitação de novos caminhos, Gobbi começou a dar aulas de programação de computadores e lógica em escolas de informática. A necessidade de aperfeiçoamento veio junto.
“Processamento de dados foi a minha primeira especialização. Buscava ampliar meu conhecimento e atualizar meus estudos iniciais. O mercado em minha área sempre exigiu isso”, afirma.
Em paralelo, exercia a docência de matemática no ginásio, hoje correspondente ao ensino fundamental (1ª ao 9ª ano).
A pausa na carreira de matemática só veio 15 anos depois, em 1998. Como consequência pertinente dos caminhos que tinha de trilhar e sem nenhuma explicação lógica, Maria Cristina decidiu mudar de rota. Os olhos se avivaram pelo mestrado em comunicação.
A dedicação ao estudo se resumiu no trabalho Na trilha juvenil da mídia impressa: identificação, perfil e análise dos suplementos para jovens veiculados nos jornais diários do Brasil, apresentado em 1999.
“Aprendi a ‘ler’ a lógica da matemática com o olhar do social, que muitas vezes não tem nada de lógico, mas de real”, diz.
Voltar à matemática não estava nos planos da professora, que se encantava cada vez mais pela comunicação e pela pesquisa.
A expectativa de aprender muito com a nova realidade possibilitada pelos meandros da comunicação social a levou para o doutorado na área. Em 2002, o título de doutora estava nas mãos. Não dava mais para escapar das teias do destino. A única alternativa para Gobbi era evoluir mais e mais no campo de atuação que assumiu a partir do mestrado.
Foi neste momento que ela decidiu partir para o pós-doutorado em Integração da América Latina.
O conhecimento que a paulistana buscava foi adquirido. E mais do que isso, o mestrado e o doutorado abriram portas na área profissional, até mesmo em outros países, com o lançamento do livro Escola Latino-Americana de Comunicação: o legado dos pioneiros, uma versão aprofundada do tema tratado no doutorado.
“O mestrado e o doutorado foram a realização de um sonho, um desafio vencido. Esses cursos me propiciaram a definição de uma profissão, que me deu estabilidade financeira e segurança, permitindo que (hoje) eu escolha aquilo que gosto de fazer”, avalia.
E não é porque tem a possibilidade de selecionar como e onde quer atuar que ela faz o mínimo. Pelo contrário. Atualmente com 51 anos, Maria Cristina Gobbi é diretora-suplente da Cátedra Unesco de Comunicação, avaliadora Ad-hoc (institucional e de curso) do Ministério da Educação para comunicação social, professora do programa de pós-graduação stricto sensu em TV digital da Unesp de Bauru, além de coordenar prêmios, grupos de pesquisa e redigir livros e artigos.
“Na verdade, me sinto privilegiada por ter as formações em ciências exatas e ciências sociais aplicadas, pois consigo ‘navegar’ pelos dois polos, embora ainda acredite que a comunicação é muito mais complicada”, brinca.
Como na música Epitáfio, dos Titãs, ela perdeu algumas coisas ao optar firmemente pelo desenvolvimento da carreira. Por outro lado, ganhou prestígio em seu meio.
“Nossos estudos são nossos patrimônios. Eles nos permitem a independência, quer financeira ou intelectual, e isso é muito bom”, reconhece.
Depois de toda a experiência vivenciada, Maria Cristina Gobbi tem apenas uma certeza: o estágio atual não é o fim; é um ponto para prosseguir. E o próximo passo já tem, inclusive, nome e sobrenome: livre-docência.
Pâmela Lee Hamer
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